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Sunday, June 27, 2010
Apesar dos protestos, no último dia 22 o governo conseguiu concluir o leilão de concessão da construção da usina de Belo Monte. O projeto, criado pela ditadura militar e ressuscitado por Lula, prevê a construção da terceira maior usina do mundo no rio Xingu.
A usina terá impacto brutal no meio ambiente e nos povos da floresta. É bem provável que represente um dos maiores ataques à ecologia das últimas décadas. Calcula-se por baixo que a usina fará sumir cerca de 50 mil hectares da Floresta Amazônica, além de cidades e vilarejos indígenas. Destruir um ecossistema como esse é o mesmo que queimar livros que a humanidade ainda não leu.
O consórcio vencedor já anunciou que pretende mudar o projeto para reduzir os custos da obra, que prevê escavações dos dois canais, cada um com cerca de 30 quilômetros de extensão, cujo volume de terra a ser retirado (de 230 milhões de metros cúbicos) é maior do que o retirado na construção do canal do Panamá. O impacto socioambiental de obra desse tipo será brutal.
“Normalmente, o impacto ambiental das hidrelétricas acontece com os alagamentos. Em Belo Monte, o impacto será duplo: além do alagamento, será preciso secar outra região, porque o rio terá que ser desviado. Isso nunca aconteceu no país e torna o projeto mais arriscado”, disse Francisco Hernandez, pesquisador do Instituto de Eletrotécnica e Energia da USP, que também coordenou um painel com 40 especialistas para estudar a obra.
Os povos indígenas que dependem do Xingu serão os mais atingidos. A construção da usina vai diminuir a vazão do rio, provocando a morte de várias espécies de peixe que servem de alimento e de base para a economia local.
Em 1989, os povos indígenas chamaram a atenção do mundo quando realizaram o 1º Encontro dos Povos Indígenas do Xingu e conseguiram fazer o governo recuar para uma revisão dos planos. Desde então, inúmeras personalidades declararam apoio à luta contra a construção. Recentemente, o cineasta James Cameron declarou que a história de seu filme “Avatar” pode ser comparada à luta dos indígenas contra Belo Monte.
Somam-se ainda as nefastas consequências socioambientais, como o deslocamento de milhares de pessoas para as cidades da região. Isso vai potencializar os problemas sociais destas cidades, ampliando a ocupação desordenada e a favelização.
O governo também é acusado de agir de forma autoritária. Sequer ouviu as populações locais.
Recentemente, o Ministério da Justiça editou uma descabida portaria que permite o uso da Força Nacional de Segurança Pública no Distrito Federal em apoio à Funai. A intenção é clara: criminalizar qualquer tipo de resistência promovida pelos povos indígenas contra as obras do PAC ou Belo Monte.
Um presente para empresários
A intervenção do governo para garantir o leilão de Belo Monte lembrou as cenas da privatização da Telebrás, realizada pelo governo FHC. Na época, o governo tucano atuou diretamente para beneficiar o capital privado.
Com a Belo Monte não foi diferente. Os dois consórcios que disputavam o leilão receberam generosos aportes financeiros do governo. Ambos tiveram a participação de estatais como manobra para alavancar o caixa dos empresários privados.
A Chesf, estatal ligada à Eletrobras, integra o consórcio vencedor (formado pela construtora Queiroz Galvão, Gaia Energia, J. Malucelli e Mendes Júnior). Já as estatais Furnas e Eletrosul participavam do segundo consórcio (integrado pela Andrade Gutierrez e pela mineradora Vale). Em ambos os casos, a participação das estatais não supera 49,9% do aporte, deixando a maioria para as empresas privadas.
Para ajudar ainda mais os empresários e afastar qualquer risco no negócio, o governo anunciou antes do leilão que a estatal Eletronorte poderá assumir até 35% de participação no empreendimento.
Mas tudo isso não bastou. O governo resolveu injetar mais dinheiro público nas mãos dos empresários e escalou o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento) para ajudá-los. O banco vai financiar 80% dos recursos da obra, estimada em mais de R$ 19 bilhões. Os empresários terão 30 anos para pagar o empréstimo, o maior prazo da história da instituição.
Qual seria a alternativa?
Construir uma grande hidrelétrica movimenta uma montanha de dinheiro e atrai enorme visibilidade política. Belo Monte vai custar mais de R$ 19 bilhões, segundo o governo. As empreiteiras, porém, estimam a obra em R$ 30 bilhões.
O projeto vai vitaminar a campanha de Dilma Rousseff, reforçando a imagem de “mãe do PAC”. Também será uma ocasião para as empreiteiras reforçarem o caixa da campanha eleitoral do PT. Além disso, obras como essa são uma enorme fonte de corrupção.
O governo Lula diz que a usina é necessária, pois evitará a ameaça de um novo apagão, especialmente no Sul e no Sudeste. Mas há motivos de sobra para desconfiar dessas palavras. Em primeiro lugar, é difícil acreditar que a maior parte da energia produzida em Belo Monte será destinada a essas regiões. Para isso, o governo teria que investir pesado em linhas de transmissão, o que não está e nem será feito.
A verdade é que os milhões de quilowatts servirão para subsidiar energia para grandes empresas exportadoras de matérias-primas como Alcoa, Votorantim, Vale, Gerdau e CSN. Todas elas participaram do leilão de Belo Monte.
Há alternativa para a produção de energia além do modelo de mega-hidrelétricas? Uma mudança profunda de padrão energético só será possível com uma transformação radical da sociedade (ver páginas 8 e 9).
Contudo, especialistas apontam que a produção de energia poderia aumentar apenas com investimentos que potencializariam novamente usinas hidrelétricas com mais de 20 anos, através da troca de equipamentos e da modernização de componentes e sistemas.
Por outro lado, o país precisa investir em fontes energéticas não poluentes. Uma boa alternativa é a energia eólica. Segundo o Atlas Eólico, lançado pela Aneel e pelo Ministério das Minas e Energia, o potencial eólico do Brasil é de 143 mil megawatts (MW). Só para comparar, a capacidade da hidroelétrica de Itaipu é de 14 mil MW. Mesmo assim, a meta do governo é produzir apenas 10 mil MW até 2020. Como o governo investe pouco neste tipo de energia, a capacidade instalada no país.
Labels: Meio Ambiente, PSTU