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Monday, November 9, 2009
O MEDO DOS LINCHADORES
Carlos A. Lungarzo (*)
Li com atraso um brilhante artigo (clique aqui para ler o artigo) do solidário e incansável Celso Lungaretti. Nele, critica uma jornalista que, depois de gratificar-se pensando que STF linchará Battisti, pensa, com receio, “mas a votação está apertada”.
O comentário do Celso é quase perfeito, mas faltou dar mais realce ao ponto final, em que a autora se pergunta sobre os votos de Toffoli e Ayres Britto.
Ela teme que Toffoli se declare apto para votar e que Ayres Britto reveja seu voto. Finalmente, se consola dizendo que isso é quase impossível, porque Toffoli deveria sentir-se impedido, por ter sido chefe da Advocacia Geral da União. Por sua vez, Britto não poderia rever seu voto, porque é um homem sério e respeitado, e mudar de voto seria um "vexame".
No caso de Toffoli, lembremos: Marco Aurélio de Mello (e desafio a alguém a mencionar outro juiz mais esclarecido e racional que ele em toda América Latina) disse que é Toffoli quem deve declarar se deseja ou não votar. Apenas ele pode dizer se está ou não impedido. Gilmar Mendes, que começou tentando “enquadrar” Toffoli, nos últimos dias ficou calado, e um portavoz do STF disse que o novo juiz poderia decidir se está ou não impedido.
Alguém que foi advogado não pode (depois) ser juiz? Se Toffoli votar, sua função na AGU será passado e não presente. Qual é a contradição?
Aliás, seria uma verdadeira contradição, se Toffoli, que estava contra a extradição sendo advogado, agora permitisse, por omissão, que Battisti fosse extraditado. Há poucos meses considerava que o dever dos juízes era proteger Battisti, e agora, se omitindo, favorece o linchamento? Não conheço Toffoli, mas pensar isso é injuriar a alguém que ainda não é conhecido pela opinião pública.
Em relação com Britto, eu pergunto: não é possível que uma pessoa faça uma honesta autocrítica? Como não sou jornalista nem advogado, só posso confiar no bom senso: eu já vi vários votos de Britto que sempre me surpreenderam pela coragem, a inteligência e a abertura de espírito.
Alguns não entendem que nem todo mundo é mercenário, que muitas pessoas se auto-respeitam, possuem coragem e senso de honra, como sobradamente tem demonstrado possuir o ministro Britto. Essas pessoas não temem reconhecer quando cometem um erro, não temem admitir que sua decisão foi precipitada, não se envergonham em dizer: “errei, porque todo humano pode errar!”.
Vexame seria insistir no erro, por medo da crítica da mídia marrom, e das ameaças dos “capangas”. Não sabemos se Britto acha ter-se precipitado, mas se ele achar que vai condenar uma pessoa a morte (e não a apenas 30 anos de prisão), sem ter absoluta convicção de que isso é certo, eu acredito que terá a grandeza de modificar o erro.
* Carlos Alberto Lungarzo é escritor, professor aposentado da Unicamp e membro da Anistia Internacional dos EUA, depois de haver passado pelas seções mexicana, argentina e brasileira da AI, na qual milita desde 1980.
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O REFÚGIO, ENFIM, A CESARE BATTISTI?
Rui Martins (*)
Berna (Suiça) - Quando um homem perdido no deserto, vacila, com a boca ressequida pela sede e o corpo cambaleante pela fome, geralmente não está só. Fazendo círculos, três ou quatro metros acima, voam pacientes abutres, esperando o momento de bicar seus olhos e de começar o festim tão logo sua presa não tenha mais movimentos.
Três dias antes da provável decisão do STF sobre a concessão ou não de refúgio ao italiano Cesare Battisti, alguns jornalistas, autocredenciados representantes do governo italiano, disparam suas últimas munições na esperança de que o Brasil extradite o antigo militante esquerdista italiano, pouco lhes importando se Battisti irá apodrecer numa prisão ou ser mais um suicida nas penitenciárias italianas. Basta-lhes faturar algum prestígio, tirar sua parte ou pedaço, enquanto a carne o sangue estiverem quentes.
Cesare Battisti não é um ex-ditador, que chega ao Brasil com seu séquito e suas economias, um Marcelo Caetano ou um Strossner que, mesmo depostos, guardavam ainda uma parcela do seu poder e influência, continuando intocáveis. Battisti é um foragido, um antigo militante pé de chinelo, sem influências nas altas esferas do poder que sempre se autoprotegem. Franco-atirador traído, transformado no bode expiatório, não pertence a um partido que o proteja, não tem retaguarda e nem guarda-costas.
Faz um ano e meio, Battisti, que se escondeu no Brasil acreditando na aura protetora do PT e de Lula, está preso de maneira arbitrária, mesmo depois do ministro da Justiça, Tarso Genro, lhe ter concedido refúgio. O objetivo do atual presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, é o de criar jurisprudência contra a concessão de refugio político pelo Brasil a militantes de esquerda. O pior é que tem gente de esquerda reforçando essa política.
Na justificativa da concessão do refúgio, o ministro Tarso Genro, argumentou com o risco de vida caso Battisti seja devolvido à Itália. E o registro, na Itália, de mais um suicídio, o 61º, de uma antiga membro da Brigada Vermelha, confirma as condições a que são submetidos os presos na Itália.
Talvez a chegada de um novo ministro no STF evite que o Brasil de Lula decida entregar à Itália, de Berlusconi e tantos neofascistas, o escritor e pai de família, que nega a autoria dos crimes a ele atribuídos, num processo duvidoso, onde houve mesmo falasificação de assinaturas.
Desde a prisão de Battisti no Rio de Janeiro, assumimos sua defesa, pois acompanhávamos pela imprensa européia sua vida de fugas e perseguições até pensar que tivesse obtido uma proteção segura na França, na época do presidente Mitterrand. Foi um longo caminho, mas hoje uma parcela da esquerda brasileira também defende Battisti, assim como gente apartidária ou de outras tendências políticas, dado o absurdo de se querer punir e liquidar um homem que vive fugindo há 32 anos. O caso tem, portanto, seu lado humanitário.
Esperamos hoje que os dois votos restantes do STF decidam pelo refúgio a Cesare Battisti, para que o Brasil confirme sua tradição de país aberto. (Fonte: Direto da Redação)
* Rui Martins, ex-correspondente de O Estado de S. Paulo e da rádio CBN, atualmente reside na Suíça, colaborando com jornais portugueses e com o site Direto da Redação.
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