Thursday, September 29, 2011


Rio de Janeiro
 
Exoneração do comandante-geral da PM do Rio agrava crise na política de segurança do governador Sérgio Cabral.

Coronel Mário Sérgio sai e evita que crise cause dano maior ao secretário Beltrame



João Marcello Erthal
Mário Sérgio Duarte, comandante da PM (Fernando Lemos)

Mário Sérgio foi o comandante que montou, pelo lado da PM, a ocupação do Alemão.

Pela Polícia Civil – primeira equipe de agentes a entrar na favela no dia da invasão – o homem forte de José Mariano Beltrame era o delegado Allan Turnowski, o então chefe de polícia


A exoneração do comandante-geral da PM fluminense mergulha a política de segurança do governador Sérgio Cabral um pouco mais fundo em uma crise que mistura corrupção policial, banditismo dentro das instituições e dúvidas sobre a eficácia do principal projeto do governo, a pacificação de favelas. O coronel Mário Sérgio Duarte, hospitalizado, assumiu integralmente a responsabilidade pela escolha do tenente-coronel Cláudio Luiz e Silva de Oliveira para comandar o batalhão de São Gonçalo. Oliveira é apontado pela Polícia Civil como mandante da morte da juíza Patrícia Acioli.

Ao sacrificar o cargo, o agora ex-comandante tenta fazer pelo governo o que não conseguiu para ele próprio: isolar a parte doente da polícia do corpo completo da segurança. Mário Sérgio, um ‘caveira’ – policial formado nos quadros do Bope – assumiu tendo a disciplina como uma de suas bandeiras. E esperava, com a prisão de três policiais acusados de atirar contra Patrícia Acioli, separar as ‘frutas podres’ do resto do cesto. A descoberta de que um
tenente-coronel em cargo de comando planejou o crime fez cair por terra essa tese, e expôs para o Brasil que a corrupção, os desvios de conduta e o banditismo, infelizmente, ainda não são casos isolados na PM fluminense.

A partir da queda de Mário Sérgio estão fora da cúpula da segurança os policiais que comandaram a histórica tomada do Complexo do Alemão, em novembro do ano passado. O episódio, marcado pela colaboração entre Forças Armadas e polícias estaduais, foi um ‘case’ de relações públicas: transformou o Alemão, uma pedra no sapato dos governantes do Rio, em exemplo de ação de segurança pública. Aos poucos, os exageros que cercaram a ação se desmancharam, e hoje sabe-se que o Alemão ainda tem traficantes armados e efetivo policial insuficiente para ser considerado uma área pacificada.

O ex-chefe da Polícia Civi, Allan Turnowski: o primeiro da dupla de heróis do Alemão a deixar o cargo

Mário Sérgio foi o comandante que montou, pelo lado da PM, a ocupação do Alemão. Pela Polícia Civil – primeira equipe de agentes a entrar na favela no dia da invasão – o homem forte de José Mariano Beltrame era o delegado Allan Turnowski, o então chefe de polícia. Turnowski foi catapultado da cadeira pela Operação Guilhotina, que descobriu a ligação de policiais, inclusive alguns heróis do Alemão, em um esquema de vazamento de informações, venda de armas e drogas para traficantes. O inquérito contra Turnowski foi arquivado e nada se provou contra ele – a acusação era de que ele teria avisado a um policial investigado que ele estava sendo monitorado.

Os dois líderes das polícias estaduais deixaram seus cargos antes que a pacificação do Alemão – a mais difícil, dado o tamanho do complexo de 13 favelas – se concretizasse. Atualmente, é o Exército quem mantém aquele território sob controle do Estado, e a entrega definitiva à PM foi adiada duas vezes, com previsão agora para junho de 2012.


O governo do estado considera “pacificada” toda favela que recebe uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP). Mas até este conceito, recentemente, precisou ser revisto. Na UPP do Fallet-Fogueteiro, foram afastados oficiais e praças acusados de receber uma mesada do tráfico. Em troca, faziam vista grossa para o movimento nas bocas de fumo e não perturbavam os traficantes que circulavam armados.


Cissa Guimarães – Os casos de corrupção que vieram à tona no último ano tiveram repercussão nacional. Em um dos mais emblemáticos, dois policiais militares foram expulsos da corporação depois do atropelamento que matou o jovem Rafael Mascarenhas, filho da atriz Cissa Guimarães. O atropelador, Rafael Bussamra, com a ajuda do pai, Roberto, teria tentado ocultar o crime com a promessa de pagar 10 mil reais aos dois PMS, que abordaram o carro avariado minutos após o acidente.


Em todos os episódios, Mário Sérgio e Beltrame reiteraram sua postura de intolerância com os desvios. Os erros na condução do caso do comandante do Batalhão de São Gonçalo, no entanto, abalaram a credibilidade de ambos. O tenente-coronel Oliveira era investigado pela juíza Patrícia Acioli. E, com a prisão de três dos policiais sob seu comando, passou a integrar a lista de suspeitos do crime. A PM, então, afastou o oficial do comando do batalhão de São Gonçalo, mas deu a ele outra unidade, o 22º BPM (Maré), tão ou mais importante que o primeiro. A revelação do envolvimento de Oliveira na morte de Patrícia
indignou a família da juíza e, inevitavelmente, deixou dúvidas sobre a tal “intolerância” com os desvios. Afinal, um PM suspeito de um crime sem precedentes – o assassinato de um magistrado – foi mantido em cargo de comando.

A exoneração de Mário Sérgio no momento em que a PM é confrontada justamente pelos crimes cometidos por maus policiais traz para o currículo de Mário Sérgio, talvez injustamente, uma página negra. E será ainda mais injusto se ele não for lembrado por algumas das conquistas que conduziu. Entre elas, redução na taxa total de homicídios no Rio, a reconquista de favelas antes impenetráveis para o poder público e uma interrupção na trágica prática de confrontos fora de controle com traficantes, os famosos tiroteios que, quando ocorrem, fazem o Rio ser comparado a um cenário de faroeste nas páginas de jornais do mundo todo.

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